O Coletivo

Blog do escritor Juliano Rodrigues. Aberto a textos gostosos de quem quer que seja. Contato: julianorodrigues.escritor@gmail.com

sexta-feira, 9 de outubro de 2015




Querem bater minha carteira

                                                                                      
                                                                                 Juliano Barreto Rodrigues


Dia desses vivi uma experiência que achei que só os grandes latifundiários viveriam. Tentaram invadir terrenos públicos do setor em que moro. É uma região de pequenas chácaras, de 5000 metros em média.

Chamou-me a atenção o fato de um grupo armado de estacas, arame farpado e enxadas chegar, do nada, e começar a medir a terra pública estabelecendo lotes. Puxa, só tinha visto coisa parecida na televisão... e era o pessoal do MST tomando fazendas. Nem sabia que alguém se organizava para invadir espaços urbanos.

De um lado a questão da propriedade privada, do outro o direito à moradia. Nós, que sabemos o custo do imóvel, debatíamos efusivamente tentando demover os invasores da idéia – absurda para nós – de se estabelecerem em uma área de mato destinada a equipamentos públicos (Cais, escola, praça, sei lá).

De resposta, tínhamos argumentos tão equivocados: diziam que eram moradores do próprio setor e arredores e que pagavam aluguel. Por não terem condições de comprarem uma casa, tinham direito – embora admitissem que estavam fazendo algo errado – de cercar uma fração de espaço público, que conforme diziam “não é de ninguém”, para exercer o direito constitucional de moradia digna.

Sem querer parecer tão parcial, a lógica era de ladrão: embora trabalhe, não tenho condições de comprar uma casa. Vivo de aluguel. Outras invasões próximas deram certo. Vou tomar um lote no espaço público.

Cheguei a tentar apontar a falácia. Disse que se assim fosse, eu que não tenho um carro poderia simplesmente tomar um na rua. Ah, diriam, mas esse é de alguém, o público não é de ninguém. Não seja por isso. Se não tenho o carro, pego uma viatura comprada pelo Estado então. Fato é que discordo absolutamente da ideia. O público é de todos coletivamente, não individualmente.

Não descarto a possibilidade de estar errado, mas, então, que me convençam com argumentos racionais, que não subestimem minha inteligência. A impressão que eu tenho é que punguistas estavam tentando roubar minha carteira sem sequer disfarçar ou agir veladamente.

Uma das invasoras fez um apelo à misericórdia, acusando-nos de atentarmos contra Deus. Afirmou que Ele estava vendo o que estávamos fazendo e que teríamos que prestar conta por não deixá-los invadir.

Penso, repenso e remoo a situação e lamento a lavagem cerebral que o governo Lula-Dilma fez com esse povo tão necessitado. A política paternalista das bolsas-tudo, do MST, dos Sem-teto, do nivelamento por baixo das profissões (veja o Mais Médicos), da crescente favelização, gerou uma concepção equivocada do que é direito, do que é democracia e política. Ao invés de aproximar as classes, as distancia cada vez mais: economicamente, eticamente e intelectualmente. Põe uns contra outros. Os mais pobres se ressentem contra a classe média, que se ressente contra os ricos, que se ressentem contra todos.

O populismo garante votos da maioria em um país predominantemente habitado por pobres. No entanto, divide, puxa para baixo em vez de para cima, distancia do progresso. A cultura deveria pender para a meritocracia, o Estado reduzindo sua tendência à “adoção” dos indivíduos. A pessoa tem que produzir seu próprio progresso, bastando que o Estado não atrapalhe (como faz no Brasil).

Não sou contra a função social da propriedade, nem contra reforma agrária, ou qualquer ação que vise reduzir as diferenças sociais, desde que isso seja feito de forma responsável e consciente, respeitando o direito à propriedade, o esforço individual, a não-violência. Como ensinava Gandhi, no caminho do meio está a solução ideal. O que não é admissível é que um grupo desordeiro cresça o olho em áreas em evidente valorização para enriquecer ilicitamente através da especulação dos terrenos que invade.

Minha vizinhança é constituída por gente instruída e com consciência social, apoiadora de projetos sociais e ambientais. É um tapa na cara terem seu quintal invadido por aqueles que lhes deveriam gratidão. Peço desculpas àqueles que entenderem diversamente.

Sonho um Estado mínimo, mas não a anarquia. Espero uma nação que se autogoverne, mas quando tiver maturidade para isso. Creio em um único caminho para a posse, a propriedade e o progresso: o TRABALHO.



sábado, 3 de outubro de 2015



                         SOPRO


                                  Juliano Barreto Rodrigues


Quero sulcar a terra com meu nariz,
Arar o chão com as pás das minhas ventas,
Pontear de cabeça o ventre vermelho
E me gastar no atrito até sumir.

Vou rasgar subterraneando,
Ao menos até sete palmos.
E ai de quem, desavisado,
Me blasfemar cantando salmos.

E quando a chuva me aguar
Eu, que não queria, vou brotar
Árvore torta de cerrado
Tão torta quanto fui no meu viver errado.


quinta-feira, 1 de outubro de 2015

LÁGRIMAS DE BRILHANTE (Microconto)




                                                                         
                                                                Juliano Barreto Rodrigues


Perguntei à senhora que se desmanchava em pranto:

--- Que dor a aflige?

--- Dor Diamante .

--- ?

--- Duríssima, reluzente, inignorável e absurdamente corruptível.