O Coletivo

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terça-feira, 29 de setembro de 2015

A DESDITA DA MORTE (não deve ser lido em voz alta)

                              Juliano Barreto Rodrigues





La Muerte, apesar de não ser querida por quase ninguém, era soberba e arrogante. Se sentia rica e cheia de si em virtude do grande poder que detinha. Um dia pretendeu o que a tornaria uma deusa: o poder da vida! Decidiu ter um filho.

Recolheu as partes mais benfeitas dos defuntos novos que apressava e construiu um belo ser.

Contrariando as leis originárias tirou o sopro de vida que animava um garoto e infundiu em sua cria. Deu certo! O filho da morte viveu pródiga e desmedidamente, garantido por sua criadora de que viveria para sempre, já que só a ela era permitido tirar a vida ao que quer que fosse, coisa que jamais faria ao seu menino.

Um dia foi surpreendida por uma armadilha da divindade dos caminhos e teve sua foice roubada pelo senhor do destino, que rapidamente a usou contra seu rebento, restabelecendo o equilíbrio da existência.

Sentiu-se destroçada, cada osso doendo insuportavelmente, já que não tinha coração. Chorou miasmas e pó. Antes desdenhosa, despiu-se de todo glamour e esfarrapou-se. Perdeu o charme de outrora e quis imensamente morrer.

Amargou o fardo do seu poder e percebeu o paradoxo de sua posição quando passou a invejar todas as suas vítimas por terem algo que ela não podia ter para si: a morte!

Percebeu que, apesar de levar o nome, não era - ela própria - a realidade da morte como acreditava,  e nem sequer sua dona, mas mera portadora.

La Muerte - nem viva nem morta e escrava de seu trabalho. Eis sua pobre condição.


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