A FORÇA
DAS (NOVAS) CONVICÇÕES
Juliano Barreto Rodrigues
Curioso admirador dos tipos humanos – hábito que talvez tenha
adquirido por transitar muito, observando diferentes pessoas o tempo
todo –, fui elaborando um repertório de padrões de reconhecimento
dos espécimes que me permite hoje, por exemplo, associar novos
ricos, novos convertidos e intelectuais recém-admitidos, num mesmo
balaio. Todos têm uma listinha de afirmações e negações a bater
até interiorizarem e serem aceitos nos seus grupos. São chatos.
Voo Brasília-Porto Seguro. Senta ao meu lado uma figura carregando
um livro grossíssimo, óculos de resina colorida, paletó mal caído
cheirando a naftalina, caneta na mão. Como todo aparecido, o homem
puxa conversa e, daí a pouco, conheço todas as suas credenciais,
nome do cachorro, endereço...
Ateu. Se declara e me olha para ver o efeito. Penso comigo: “a mais
velha modinha entre todo novo intelectual. Acho até que quase
inexista algum intelectual de escol que não tenha sido ateu por,
pelo menos, cinco minutos”.
Não disse nada, mas o homem disparou seus motivos. Elucubrou por
meia hora, um saco.
Solavanco. Turbulência. Meu vizinho virou a descompostura em pessoa:
– Ai meu Deus, ai meu Deus, Nossa Senhora, Diviiiino Espírito
Santo – repetia sem parar agarrado ao meu braço e suando rios.
No ridículo da situação eu disse:
– Calma, calma, Deus ajuda quem tem fé.
Passados os quebra-molas aéreos, o tipo se virou para o corredor e
nem olhou mais para mim. Quando foi desembarcar eu ainda arrisquei um
“vá com Deus”. Acredita que o desaforado nem me respondeu?
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