TEMPO, TEMPO, TEMPO, TEMPO.
Juliano Barreto
Rodrigues
“Um
minutinho só...” é muuuito tempo para quem briga por segundos.
Não dá para perder por pouca coisa. Quando me param para algum
assunto com o argumento de que “é rapidinho”, fica difícil
esconder minha incredulidade e descontentamento. Vivo correndo, faço
tudo turbilhonando, bem ao gosto do mainstream Y
generation. Só que sou da transição, tenho um pé lá na rua
de terra batida, na época do telefone de ficha, da conversa atoa com
os vizinhos no portão. E, conforme Cioran (embora em contexto
diferente daquele em que ele falou): “Todos somos perseguidos por
nossas origens”.
O
ritmo das pessoas é diferente. Conversar com quem está aposentado e
tem o dia todo para resolver as contingências é bem oposto a falar
com o cara que divide o tempo entre o trabalho, a obrigação de
levar as crianças ao colégio, o curso que tem para fazer, a atenção
à esposa, o almoço, o jantar, e uns 40 minutos para fazer amor umas
duas ou três vezes por semana.
Me
ressinto com a falta de tempo. Anda difícil parar para ver a
arquitetura da cidade, um por-de-sol fora do carro, degustar alguma
coisa, deixar de representar o papel de “animal laborans”. Poder
viver fazendo exclusivamente o que se gosta então? Nem se fala.
impossível
entender o porquê de cada um não estar empenhado só no que deseja.
Nós nos perguntamos: “E se ficar difícil se manter?” Como disse
o filósofo, sempre dá, na pior das hipóteses, para morrer de fome.
Falando
em fazer o que desejamos, lembrei de Fernando Pessoa sentenciando:
“[...] Viver não é necessário; o que é necessário é criar. /
Não conto gozar a minha vida; nem em gozá-la penso. / Só quero
torná-la grande, ainda que para isso tenha / de ser o meu corpo e a
(minha alma) a lenha desse fogo. [...]”. Ele alegou querer tornar
sua vida 'grande' para a humanidade, ainda que se dissolvesse para
isso. Apesar de parecer altruísta, no fundo queria era viver total e
egoisticamente seu desejo-paixão em criar.
Um
círculo vicioso escraviza aqueles que sonham ser livres: é preciso
dinheiro para gozar a vida e, para a maioria dos seres, isso demanda
trabalho. Baudelaire, dandi,
disse: “o
dinheiro é indispensável às pessoas que fazem de suas paixões um
culto”. Assim,
a solução seria
gostar de algo lucrativo.
Mas
paixão é paixão, e 'álea'
está na sua essência.
Lamento porque está
se perdendo o tempo da sutileza, das coisas bem-feitas no detalhe, à
mão, com valor principalmente por serem únicas nas minúcias.
Recordo-me
de um artesão que tira dos blocos de barro os santos da devoção
das gentes e os vende na porta de sua casa. São peças de uma fina
combinação da mão da enxada com
o requinte da cabeça
do
artista. Não negam a ascendência de nenhuma das duas: dá para
sentir a força do tato matuto na anatomia das figuras, moldadas por mãos calejadas e dedos grossos e, ainda assim, também se vê as faces
puras e delicadíssimas que parecem ter saído de mãos de rendeiras
muito caprichosas.
Faz
tempo que não sinto alguma sensação levezinha, como a brisa fria
na ponta da orelha, um arrepio por uma boa lembrança, um sabor de
comida da roça. Sou um homem do meu tempo “não vivo do passado,
mas o passado vive em mim” (Paulinho da Viola), não dá para
negar. Sou bem adaptado às tecnologias de agora, ao frenesi, aos
excessos – inclusive de informação. Mas sofro de uma certa
nostalgia e tenho saudades daquela […] aurora da minha vida, / Da
minha infância querida / Que os anos não trazem mais!” (Casimiro
de Abreu).
Então,
quando me pedem “um minutinho só...”, sinto que lá se vai um
daqueles momentos leves, de abstração, em que poderia estar
captando algo de belo, mas terei que gastar tempo com a simples
sobrevivência. Sou dependente da reflexão – coisa que não se faz
com pressa -, não ajo no automático, gosto de ver sentido nas
coisas, e dou valor às frivolidades. Por isso, viver devagar,
segundo a segundo, me é tão precioso. Você consegue viver seu
tempo?
Nenhum comentário:
Postar um comentário