PAI ESCRITOR II
Juliano Barreto Rodrigues
Cinco
meses! É a idade do meu bebê agora. As coisas começaram a entrar nos eixos no
terceiro mês. Trocar fralda, ser atingido por um jato de regurgitado? Besteira!
Isso não é nada. Limpo o neném, dou banho, troco fraldas e dou mamadeira feito
um profissional, quase de olhos fechados (e ainda cantando para ele).
Desde
que engravidamos, eu e minha esposa nos preocupávamos sobre como a rotina de
sono afetaria nosso bem-estar quando o neném nascesse. É que meu bom humor
sempre foi dependente de uma noite bem dormida.
Foi o
caos! Coisa traumatizante. Tanto que temporariamente descartamos a ideia (louca,
kkkkk) de ter outro filho. Mas enfim, não morremos e... passou. A grande mágica
foi ele ter passado a dormir a noite toda – isso fez toda a diferença em nossas
vidas. Agora conseguimos olhar para ele sem ficar com medo da noite.
Por
mais que tenha sido desejado e planejado, ao nascer o bebê é meio como um visitante
desconhecido que, embora dê trabalho, você não quer que vá embora (calma, eu
explico). Sei que ele não é um estranho. É que o instinto de proteção e o apego
que se tem pelo recém nascido não tem nada a ver com a forma comum de amor mais
usual.
No
primeiro momento descobri um amor instintivo, uma coisa que faz com que o
indivíduo simplesmente seja capaz de dar a vida por um ser que acabou de
conhecer – e o neném é isso. Esse amor não é racional e nem se parece com
qualquer outra coisa que já vivi, porque não vem precedido do encantamento e
apaixonamento normais da convivência.
É o
dia-a-dia com a criança que vai levando ao amor, por assim dizer, “normal”: as
expressões, os barulhinhos, o cheirinho, a intimidade, o reconhecer-se, as
expectativas, se encarregam de aproximar pai e filho e fazer com que se digira
melhor o sentimento que o pequenino lhe causa. Aí o homem (no caso eu, que,
como quase todo ser humano do sexo masculino, sou pejorativamente cartesiano)
volta ao lugar-comum da forma confortável de amor que conhece. Então
desassusta-se.
---
Venha com o papai --- falo para meu filhinho enquanto o pego nos braços. Isso,
de se autodenominar “papai”, tem uma força psicológica enorme. Vai ocorrendo
uma lavagem cerebral e me sinto cada vez mais pai, mais responsável por ele e
cabendo melhor no papel.
Após a
tempestade dos primeiros meses estou mais calmo e um pouco mais senhor do meu
tempo. Contraditoriamente, tenho escrito menos e, talvez, pior. É que a pressão
da escassez de tempo sempre consegue extrair de mim o melhor. Acho que seria um
bom redator de jornal.
Tenho
descoberto uma novíssima realidade, de ter que levar o bebê se quiser tomar um
chope com minha mulher, de não ver o fim de expediente acabar para poder chegar
logo em casa (se bem que isso minha esposa já causava), de pensar em dinheiro –
confesso que sempre fui meio alheio a isso. O menino tem cinco meses e estou
pensando em colégio, em aula de inglês, curso de pintura, temporada em
Piracanga..., intercâmbio, previdência privada, etc., etc., etc., espero não
sobrecarrega-lo com meus planos, mas acho difícil.
No
final das contas o que sei é que não viveria mais sem meu filho. É como se ele
estivesse sempre estado comigo, como um órgão vital do corpo. Muito estranho!
Mas a plenitude que desperta, transborda.
Quando
acontece alguma coisa inusitada, tipo o neném fazer cocô na hora de sair,
estando já todo arrumadinho – e nós já atrasados – brinco com a mãe: “Vai ter
filho... tá vendo? Agora aguenta!” A paciência acaba por alguns minutos e, daí
a pouco, a carinha dele já engambelou a gente de novo e estamos em suas mãos.
Sobre o
tipo de amor que a paternidade causa, lembrei-me de uma frase de Monte Castelo,
do Legião Urbana que, parafraseando Luiz de Camões, define que, amar assim.. “É
um estar-se preso por vontade”. É bem isso.
Vamos
ver onde isso vai dar. Todo dia é uma coisa nova, ele conquista mais uma
habilidade, dá um trabalho e uma alegria diferente, cresce. Já tenho saudade do
que passou.
Aproveitando
o espírito natalino, fecho esta conversa com uma oração:
Pai
Nosso, que nos permite estar na posição de pais para entender o que é o amor
que sentes,
Santificado
seja o vosso nome e a humanidade que ter um filho planta em nosso peito.
Venha
a nós todas as capacidades necessárias para bem formar nossa(s) cria(s),
Seja
feita a vossa vontade, assim na terra como no céu, mas seja complacente com
nosso(s) filhinho(s).
O pão
nosso de cada dia nos dai hoje em abundância, porque nossa família cresceu.
Perdoai
as nossas faltas de paciência, e que ele(s) também nos perdoe(m).
Não
nos permita cair na tentação de afrouxar a atenção na formação dos filhos.
Livrai-nos
do mal - mas primeiramente, livra-o.
Amém.
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