DOM-DOM
Juliano Barreto Rodrigues.
--- Pára
de ser se-metão, ô cimitarra. Vê se se atipa, seu comédia sem noção!
Foi assim
que a nega Dom-Dom começou a briga. Que bichinha mais arrepiada aquela menina.
Também, pudera, onde já se viu uma morta-de-fome daquela ter um nome tão
importante: Domitila?! Já nasceu metida e encrenqueira. O Sinésio, que se
achava o “MC” do pedaço, só de ver a doida já encrespava. Acho que era amor.
Sei que naquele dia a coisa foi feia; depois que a Dom-Dom tirou com a cara
dele, o figura surtou:
--- Tá
falando comigo periguete? Nem sei quem é você.
Pronto.
Deu asa para cobra, mexeu com os brios da garota.
---
Periguete é a puta da sua mãe e você sabe muito bem quem eu sou, tanto que
antes de descer o morro vivia no meu pé. Só porque deu pra tocar uns funkzinhos
fajutos tá se achando?! Tem que comer muuuito feijão pra poder ostentar pra
cima de mim. Tô acostumada com homem de verdade, não com moleque.
O sangue
subiu no olho do Sinésio. A galera da comunidade tava vendo a nega crescer
sobre ele. Tinha que mostrar quem mandava, afinal ele já tinha conseguido se
lançar na pista, a zona norte já o conhecia, não só o povo da favela. Já era
alguém na vida. Pensou rápido e decidiu não dar IBOPE. Por hora bastou um “vai
se fuder” falado já de saída.
Dom-dom
ficou lá xingando e se vangloriando pela vitória. Não achou que a coisa iria
dar pano-pra-manga.
Um mês
depois ia ter um baile funk no pé do morro. Teria um concurso de beleza entre
as várias comunidades simpatizantes. Dom-Dom já estava preparando dança, fala e
roupa. Tinha até fã-clube. A única coisa que tava pegando era o showzinho do
Sinésio.
Marquinho,
mais conhecido como Sherazade, era a personal
stylist da Dom-Dom. Fazia as trancinhas, depilação, maquiagem, unha, e as
marquinas de biquini com esparadrapo que ela cultivava na lage do salão. Era
sua confidente e incentivadora, uma traveca multimídia. Já tinha sentido um
certo nervosismo diferente na nega:
--- Fala
amiga, que é que você tem? É por causa daquela celebridadezinha de um segundo
que cê tá assim? Quem é MC Sinésio? Quem é? Você já colocou ele no lugar dele.
Força na peruca, minha linda! Não tem nenhuma pet-cat mais bonita do que você
nesse concurso.
Pior era
ter que ensaiar a coreografia do hit do Sinésio. Mas não tinha outro jeito, se
tinha que dançar, que fosse.
Os dias se
passaram e a nega tava parecendo rainha de bateria. Tava tudo no lugar,
brilhando de bronze e óleo. A menina realmente dava gosto de ver, parecia a
Viviane Araújo.
No dia do
show, Dom-Dom foi em comitiva. O morro todo tava lá. Foi para os bastidores se
produzir. Era uma das últimas que seriam chamadas. O som começou a rolar e lá na
coxia só Chandom na alta pra soltar as garotas. O baile bombando o DJ anunciou
o concurso.
Dom-Dom
deixou só a roupa pra vestir por último. Era pouca coisa, só um top da La Bela
Máfia e um shortinho John John. O que daria o plus seria o saltão dourado, o
cabelo feito, as pulseiras, anéis, brincos e a correntona de ouro que só uma
diva da comunidade - de verdade - conseguia ter.
Altas
horas o DJ, pra jogar um confete no Sinésio, diz que ele é quem vai apresentar
as meninas. Pau quebra. O Sinésio chamava Mariana, Carolina, Duda do Vale da
Ponte, Loira, Márcinha novinha, Suzy, Keithielly e mais umas dez. Uma a uma
entravam, faziam carão, dançavam, falavam e saiam. Dom-Dom só na ansiedade.
Chegando
sua hora, Dom-Dom procura sua roupa e cadê. Procura de um lado, procura do
outro, roda a baiana, dá piti e nada. Sem outro recurso pede emprestado pras
outras meninas. Que? Nenhuma daquelas invejosas ia fazer uma graça dessas, né?
De repente ouve o Sinésio anunciando o final das apresentações, depois só iria
faltar o julgamento. Quando não chamou por ela, Dom-Dom entendeu que era
vingança. Aquele sem-vergonha tinha armado tudo pra ela não entrar.
Brava
feito Iansã na tempestade, e com a Gira no couro, a nega só deu a volta na
toalha, tampou o que dava, meteu o salto e partiu furiosa pro palco. Quando
entrou só a pick-up estava tocando, sem ninguém cantando. Chegou chegando.
Quando a galera viu aquilo foi ao delírio. O Sinésio ficou ali plantado com
cara de besta e afinou pro olhar da nega. Viu que tinha perdido. Ela abusou,
roubou a cena pra valer. Por fim, pediu o microfone, falou de si e pediu uma
música do MC rival do Sinésio. Foi o fecho que faltava: Domitila desfilou feito
uma rainha; dançou de um jeito que todo mundo surtou. Para pôr um ponto
final, antes de sair jogou a toalha no público. Saiu de lá vitoriosa e
consagrada.
Na
segunda-feira só dava ela. Fotos de Dom-Dom circulavam na net e sua ousadia era
contada nos programas de TV. Sua fama foi meteórica. Detonou o Sinésio em todas
as oportunidades que teve. Ele entendeu que uma mulher desfeiteada é perigosa absurdo.
Um belo
dia Dom-Dom recebe um zapzap assim: “Oi my princess, vc tava linda na Ana Maria
Braga”. Sem muito interesse ela pergunta: “Brigadim, quem é?” Daí a pouco vem a
resposta: “É o MC Sinésio, tá de boa?” Domitila, chocada pensa um pouco, fala
uns impropérios, rói o esmalte, sapateia sem sair do lugar, pensa mais um pouco
e, com medo de deixar o momento passar escreve: “De boa, e vc?” E o Sinésio:
“Queria te ver”. Ela ri pra si mesma e manda: “Tá”.
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